terça-feira, 23 de novembro de 2010

A Retomada



Da mesma forma que Carlota Joaquina não queria aportar no Brazil, ninguém queria ter o cinema brasileiro nos braços no final do governo Collor, em 1992, maltrapilho e mal tratado. Mas assim como a princesa casou-se obrigada com Dom João VI e tornou-se “Princesa do Brazil”, o cinema brasileiro deu mostras de poder deslanchar apesar das inúmeras barreiras que lhe dificultavam a vida. Com a queda do “Presidente Mauricinho” (na música de Lobão) por via dos caras pintadas que invadiam a avenida, Itamar Franco assumiu a presidência do país e deu o aval para que projetos que incentivassem a produção de conteúdo e imagem na telona voltassem com todo vigor. Ou nem tanto, o início foi claudicante, e há quem afirme que ainda seja. Mas é inegável a qualidade técnica que o cinema brasileiro alcançou a partir da criação da Globo Filmes, com todo o padrão de qualidade da monopolista emissora televisiva.

Estava criado um novo jeito de fazer cinema, seguindo a linha de atores globais e tendências novelescas. Carlota Joaquina com Carla Camurati abriu caminho, “Central do Brasil” seguiu a trilha e produções do status de “Tropa de Elite” e “Se eu fosse você”, com direito à continuação nos moldes de sucessos americanizados, deram definitiva sustentação ao modelo. Estava dada a retomada do cinema brasileiro.

O Filme: Carlota Joaquina, Princesa do Brazil



A abundante nobreza de Marco Nanini e seus pitorescos hábitos alimentares desenham um Dom João VI típico do escracho cinematográfico que propõe o filme. Cartola Joaquina de Marieta Severo aparece igualmente exagerada, escandalosa e antipática. O tom de comédia transversal está dado. Na trajetória da “Família Real” até o Brazil dos pesadelos de sua nova princesa saltam aos olhos as imagens tecnicamente perfeitas, o colorido estrategicamente planejado e a excelência das ambientações produzidas. Afora isso, o elenco é de primeiríssima qualidade, e oferece para admiração as interpretações de generosos comediantes do quilate dos já citados e ainda Ney Latorraca, Ludmila Dayer, Maria Fernanda e o extraordinário André Abujamra. O filme é conduzido em tema de sátira e diabólicas exaltações promíscuas às aventuras da “Família Real” portugobrazileira.

O Ícone: Fernanda Montenegro



Fernanda Montenegro já era uma excepcional atriz de cinema quando interpretou “A falecida” da obra de Nelson Gonçalves. Não à toa, estreou como protagonista. E assim se mistificou na dramaturgia brasileira com todo o direito, muito mais do que pompa e circunstância, Fernanda Montenegro sempre expressou talento. Percorreu uma trajetória de muitos aplausos e sucessos e se consolidou como a grande atriz de seu tempo, agraciando o espectador, entre muitos outros, com o filme que se tornou um dos símbolos da retomada do cinema brasileiro: Central do Brasil, a bela história do menino que escreve cartas para o pai desaparecido. E é Fernanda quem desempenha papel de fundamental importância e sabedoria na trama. Suas aparições na tela ou no palco não podem ser classificadas segundo os adjetivos usuais entre os críticos: contida ou expansiva, simples ou exagerada, delicada ou agressiva. Fernanda Montenegro é de compreensão.

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