segunda-feira, 21 de maio de 2012

Esquina Musical




Na Esquina Musical você encontra sons, letras, ruídos, palavras. Tudo que rima e flui. Do Funk à Música Clássica. Poesia, Cinema e Teatro. Jornalismo e Literatura. Cultura.

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Espero vocês lá! Atualizações diárias =)

Abraços,

Raphael Vidigal

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Entrevista

Entrevista com o cineasta, historiador, pesquisador, roteirista e professor Ataídes Braga.



1- Qual o grande diferencial do cinema brasileiro para os demais cinemas que se praticam no mundo?

Toda cinematografia tem importância mas o que difere cada uma delas é o registro de sua identidade, sua cultura, seus valores, a representação de seu povo, enfim, o caráter do brasileiro, não pode ou não deveria ser apresentado senão pelo brasileiro com riscos de serem caricaturados.

2- Qual movimento mais influenciou o cinema brasileiro?

Cada época teve um marca e vários registros de influências são notados, por exemplo, o nosso primeiro cinema foi muito influenciado pelas vivências de muitos pioneiros que eram estrangeiros, italianos, portugueses;já as tentativas industriais pelo modelo americano e italiano; o cinema novo e um cinema independente dos anos 50/60 claramente pelo neorealismo italiano e pela nouvelle vague francesa; as pornochanchadas pelo cinema erótico italiano e depois vários cineastas, a partir dos anos 80, por todo mundo de fora e de dentro do Brasil.



3- Qual das vertentes do cinema brasileiro tem maior repercussão artística, na sua opinião?

Depende de muitos fatores: se for do ponto de vista de público, bilheteria, os filmes que mais fizeram sucesso, são as chanchadas musicais e as pornochanchadas, se for do formato do belo, muitos filmes da Cia Vera Cruz podem ser reconhecidos; se for do político, quase todos os filmes do cinema novo, se for na contemporaneidade, podem ser Central do Brasil, Cidade de deus , Tropa de elite e tantos outros, logo depende...

4- Porque o cinema brasileiro tem um histórico de atrair pouco público às suas exibições (com exceção da chanchada)?

Não é verdade totalmente, em vários momentos, muitos filmes fizeram muito sucesso e hoje isso já não é tão determinante, muitos já o fazem, às vezes, a dificuldade é a mesma de sempre, ausência de distruibuição e falta de espaços para exibição, quase totalmente tomado pelo filmes estrangeiros.



5- Quem são os grandes diretores, os grandes produtores e os grandes atores do cinema brasileiro?

São muitos, de minha preferência: Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos, Roberto Santos, Ana Carolina, Sérgio Bianchi, Eduardo Coutinho, Beto Brant, dentre outros.

Na produção, gosto mais das mulheres, Sara Silveira, Glaucia Camargos, Mariza Leão, apesar de saber da importãncia de Luiz Carlos Barreto.

Também são milhares; Oscarito, Grande Otelo, Paulo José, José Dumont, Paulo Autran, Fernanda Montenegro, Odete Lara, Glauce Rocha, Fernanda Torres, Lázaro Ramos, Wagner Moura, dentre muitos.


PERGUNTA LIVRE:

6- O que você acha do ator Paulo César Peréio?

Eu gosto muito, como ator sempre representou o lado bandido, canalha, marginal, que em muito engrandeceu o cinema brasileiro, como locutor e durante muito tempo a voz do cinema brasileiro, pouco sabem disso, é marcante, e como o conheço pessoalmente, acho brilhante, culto.

e como ele mesmo diz....não sou mau-caráter, não tenho nenhum caráter. Sobrevivo por que erro, porque peco.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

A Retomada



Da mesma forma que Carlota Joaquina não queria aportar no Brazil, ninguém queria ter o cinema brasileiro nos braços no final do governo Collor, em 1992, maltrapilho e mal tratado. Mas assim como a princesa casou-se obrigada com Dom João VI e tornou-se “Princesa do Brazil”, o cinema brasileiro deu mostras de poder deslanchar apesar das inúmeras barreiras que lhe dificultavam a vida. Com a queda do “Presidente Mauricinho” (na música de Lobão) por via dos caras pintadas que invadiam a avenida, Itamar Franco assumiu a presidência do país e deu o aval para que projetos que incentivassem a produção de conteúdo e imagem na telona voltassem com todo vigor. Ou nem tanto, o início foi claudicante, e há quem afirme que ainda seja. Mas é inegável a qualidade técnica que o cinema brasileiro alcançou a partir da criação da Globo Filmes, com todo o padrão de qualidade da monopolista emissora televisiva.

Estava criado um novo jeito de fazer cinema, seguindo a linha de atores globais e tendências novelescas. Carlota Joaquina com Carla Camurati abriu caminho, “Central do Brasil” seguiu a trilha e produções do status de “Tropa de Elite” e “Se eu fosse você”, com direito à continuação nos moldes de sucessos americanizados, deram definitiva sustentação ao modelo. Estava dada a retomada do cinema brasileiro.

O Filme: Carlota Joaquina, Princesa do Brazil



A abundante nobreza de Marco Nanini e seus pitorescos hábitos alimentares desenham um Dom João VI típico do escracho cinematográfico que propõe o filme. Cartola Joaquina de Marieta Severo aparece igualmente exagerada, escandalosa e antipática. O tom de comédia transversal está dado. Na trajetória da “Família Real” até o Brazil dos pesadelos de sua nova princesa saltam aos olhos as imagens tecnicamente perfeitas, o colorido estrategicamente planejado e a excelência das ambientações produzidas. Afora isso, o elenco é de primeiríssima qualidade, e oferece para admiração as interpretações de generosos comediantes do quilate dos já citados e ainda Ney Latorraca, Ludmila Dayer, Maria Fernanda e o extraordinário André Abujamra. O filme é conduzido em tema de sátira e diabólicas exaltações promíscuas às aventuras da “Família Real” portugobrazileira.

O Ícone: Fernanda Montenegro



Fernanda Montenegro já era uma excepcional atriz de cinema quando interpretou “A falecida” da obra de Nelson Gonçalves. Não à toa, estreou como protagonista. E assim se mistificou na dramaturgia brasileira com todo o direito, muito mais do que pompa e circunstância, Fernanda Montenegro sempre expressou talento. Percorreu uma trajetória de muitos aplausos e sucessos e se consolidou como a grande atriz de seu tempo, agraciando o espectador, entre muitos outros, com o filme que se tornou um dos símbolos da retomada do cinema brasileiro: Central do Brasil, a bela história do menino que escreve cartas para o pai desaparecido. E é Fernanda quem desempenha papel de fundamental importância e sabedoria na trama. Suas aparições na tela ou no palco não podem ser classificadas segundo os adjetivos usuais entre os críticos: contida ou expansiva, simples ou exagerada, delicada ou agressiva. Fernanda Montenegro é de compreensão.

O Cinema Marginal



O Cinema Marginal era o noviço irreverente do Cinema Novo. Desobrigado de engajamentos, se dava ao direito de fazer gracinhas, e com direito adquirido pela inventiva criatividade de seus diretores. Muito mais ligados ao cinema na essência do que os primos políticos, o cinema que construíram surgiu justamente dessa dissidência provocada por rivalidades conceituais e estéticas. Não sendo de todo discordante nem pretendendo tal mérito, buscou referências nas assumidas influências estrangeiras e se esgueirou de qualquer tentativa pretensiosa de produzir uma arte pura, nova.

Então foram marginalizados e dispararam críticas ferozes para todos os lados, com um toque irônico de cinismo que é sempre a melhor maneira de ofender a realidade: mostrá-la em sua mediocridade crua com graça. Júlio Bressane, Rogério Sganzerla, Silvério Trevisan e Ozualdo Candeias exibiram a desesperança de personagens complexos, inseridos em contextos confusos e disformes, com doses acachapantes de paródias aglutinadoras. Ficaram na margem do chamado "circuito do cinema brasileiro". Ainda assim, viram de perto o mar. Melhor do que muitos outros que se afundaram em suas ondas.

O Filme: O Bandido da Luz Vermelha



O banditismo do Luz Vermelha era romântico e sedutor. E principalmente, romantizado. Essa estratégia de se glamourizar o vilão no cinema nacional já havia sido testada com sucesso muitas outras vezes, mas não com a ousadia estética que propunha Sganzerla. O filme começa em ritmo de alucinante perseguição policial típica dos filmes americanos e do estilo noir de se fazer cinema. Com um toque na dose certa de cinismo enfático. Logo na primeira cena os personagens são apresentados sem que se tenha tempo hábil para conhecê-los ou identificá-los numa próxima cena. Tudo através do rádio. Tudo faz parte do clima em que é ambientada a tela de cinema; transformada em abrigo fúnebre das loucuras do Luz Vermelha, que toma conta do espetáculo coadjuvado por políticos corruptos, vítimas apaixonadas e policiais bonachões. O fim do bandido é o mesmo de quem o procura. A gargalhada é o episódio final do filme que acusa quem pretende policiar.

O Ícone: Júlio Bressane



Júlio Bressane fundou com Rogério Sganzerla a Belair Filmes, em 1970, com a qual conseguiram rodar seis filmes no espaço de seis meses. O cineasta carioca buscou desde cedo um contraponto em suas obras e passou a praticar o cinema marginal como forma de advertência à sensibilidade, a observação, o silêncio, a sombra, a percepção. “Matou a família e foi ao cinema” em 1969 e consagrou-se como instrumentista do gênero. Em suas correlações de peculiar sintonia com um universo incompreensível e diverso, expande-se sua capacidade de produzir relatos artísticos entremeados por considerações conceituais. É a força da sensação que busca Júlio Bressane. A vaia para a Cleópatra Alessandra Negrini é sua intervenção definitiva no ramo da história cinematográfica brasileira.

O Cinema Novo



O Cinema Novo trouxe a marca de “uma câmera na mão, e uma idéia na cabeça”. E câmera na mão treme, incomoda, de preferência, revoluciona. Essa era a idéia dos idealizadores do movimento, políticos que gritavam contra a injustiça através da estética da fome. E se era estética, era arte. Portanto livre de compromissos com o público, as grandes empresas, o lucro, a bilheteria. Havia um quê vermelho sangue naquelas produções ideológicas e contestadoras. A novidade era tamanha, que os participantes do inicial cinema faziam questão de repudiar tudo que já havia sido feito. Era novo mesmo.

E como o novo tem por mania afastar situantes que conservam valores inquestionáveis, teve por serviço afastar com louvor as platéias acostumadas à chanchadas cômicas. O cinema novo não estava pra brincadeira. Empunhava com orgulho sua bandeira suada de batalhas e de Rios a 40 graus de febre.

O Filme: Deus e o Diabo na Terra do Sol



A ditadura e “Deus e o Diabo na Terra do Sol” fizeram suas vítimas no mesmo ano, de 1964, e se perpetuaram por longo tempo. Ambas foram combatidas e contestadas com as armas possíveis. Ao que a truculência ditatorial respondia com crimes hediondos e torturas, a violenta película cinematográfica sobre o vaqueiro Manuel questionava com a mesma veemência. Estavam ali sendo feitos dois movimentos distintos de embate, correndo por veias sanguíneas e sanguinárias. A Bahia de Glauber Rocha buscava a tradução de um Brasil por inteiro, pobre, na raiz, sofrido. O Brasil ditatorial era a metade de uma condição pré-humana, onde se matava quem fosse contra o regime. Glauber bem que tentou inserir seu regime próprio, mais na tela, desrespeitando com categoria quem lhe indagasse o contrário. E o diabo se viu sob a terra do sol até o final de 1985. Antônio das Mortes permaneceu por mais tempo no imaginário coletivo brasileiro.

O Ícone: Glauber Rocha



“Glauber se consumiu em seu próprio fogo”, falou o poeta Ferreira Gullar. De fato o incendiário diretor nascido no interior da Bahia tinha a primitiva forma de defesa inventada pelo homem como uma de suas armas. Glauber propôs um cinema faminto por combates e guerras inglórias. Um Brasil que fosse mostrado na tela tal qual miserável e apocalíptico era. Conseguiu através de suas agitações gestuais que deixaram um importante legado cultural para o país por qual se aventurou registrar no cinema. Seu cinema novo que realmente tornou-se posse de sua figura, dada a característica dominante de sua personalidade. O instinto falou mais forte que o homem, da mesma maneira que fez sua arte valer através de sua sensibilidade sensorial atravessou esse mundo com fogo.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

A Chanchada



A Chanchada teve o seu ápice no cenário cultural brasileiro do início da década de 30, até o fim dos anos 50. O gênero trazia uma narrativa simples, marcada por uma forma ingênua de fazer comédia, trazendo temas populares. Principalmente no início, tinha o carnaval como assunto de suas obras.

Apesar do termo chanchada ter nascido para descrever filmes brasileiros na década de 30, há controvérsias quanto à data em que tais obras realmente surgiram. Há aqueles que colocam como ponto inícial do gênero, o filme Nhô Anastácio Chegou de Viagem, de 1908, o primeiro filme de ficção do país. Por outro lado, existem aqueles que consideram o movimento a partir do primeiro filme falado: Acabaram-se os Otários, de Luiz Barros. Além desses, existem aqueles que só contam a chanchada a partir de 1941, pelo nascimento da Companhia Cinematográfica Atlântida.

Os filmes do gênero muitas vezes traziam paródias de obras do cinema norte-americano, contudo, utilizavam de adaptações para temas do cotidiano nacional. Os personagens geralmente eram uma caricatura do que representa o jeitinho brasileiro e a malandragem carioca.

O Filme: Nem Sansão, Nem Dalila



O filme tem direção de Carlos Manga e é uma paródia do clássico Sansão e Dalila, de Cecil B. DeMille. Oscarito vive o barbeiro Horácio, que bate seu carro na casa de um cientista maluco, acionando uma máquina do tempo, que o envia ao ano de 1153 a.C., no reino de Gaza.

Na comédia, Horácio conhece Sansão e descobre que sua força provinha de sua peruca. O barbeiro então troca a mesma por um isqueiro, adquirindo poder e força e, então, passa a reinar Gaza como um ditador bonachão.

O Ícone: Oscarito



Oscarito nasceu na Espanha, filho de pai alemão e mãe portuguesa. Mudou-se para o Brasil com apenas um ano de vida, em 1906. Nasceu em família circense, fato que trouxe o espetáculo em suas veias desde o início da vida. Aos cinco anos de idade já era palhaço, trapezista, acrobata e ator. Estreou no cinema em 1935, com o filme Noites cariocas.

Ficou famoso no Brasil ao lado de Grande Otelo, outra lenda das chanchadas, com quem protagonizou diversos filmes. Um dos maiores ícones da história do humor nacional, Oscarito nasceu e morreu pelo show. No dia 4 de agosto de 1970, o artista já estava aposentado, mas dentro de casa tentou reproduzir seu pulo característico, que ficara marcado no Brasil, quando teve o acidente vascular que tirou sua vida.

A Pornochanchada



Nelson Rodrigues foi um dos preferidos, se não o escolhido, para ter suas obras passadas ao olho do “buraco da porta” da pornochanchada. O auto-apelido do dramaturgo, “anjo pornográfico”, era a cara descarada do gênero surgido na década de 70 para resgatar um jeito simples de contar histórias e atrair o público, combinando pornografia baratinha, quase inocente, sem os escândalos boateiros de sexo explícito, com muito deboche, comédia irônica e violenta. Algum autor mais indicado do que o jornalista dos contos da “Vida como ela é”? Difícil imaginar, afinal todos os personagens da pornochanchada podiam ser vistos como a dama do lotação, a prostituta Geni ou os malandros interessados em estupros de qualquer tipo.

Encenada muitas vezes na freqüentada “boca do lixo” de São Paulo, claro, por personagens reais e fictícios, a obra pornochanchadeira, que tinha o complemento do gênero que mais fez sucesso popular com o público brasileiro por discorrer na tela características da comédia de costumes, tornou-se mal falada e pouco assumida inclusive por aqueles que participaram dela. Em especial as atrizes que não queriam ser vistas como específicas daquele cinema “barato, baixo, feito para a camada popular.” Coube a Arnaldo Jabor, Nelson Rodrigues, mesmo Sônia Braga e Paulo César Peréio assumirem o “filho que era teu”. E por direito.

O Filme: Toda Nudez Será Castigada



O ridículo da história é que dá o tom da comédia autêntica. Paulo Porto como um viúvo chorão e puritano aparece impagável, enquanto Darlene Glória encarna a prostituta que havia em sua essencial sensibilidade artística antes de se tornar evangélica. “Toda nudez será castigada” é seminal parceria da transição das obras de Nelson Rodrigues para as telas do cinema através do olho do cineasta/jornalista político Arnaldo Jabor. A história transcorre em clima de violência por todas as partes, sexo em quartos de bordel e muita comédia escrachada, protagonizadas principalmente pelo irmão cafajeste do viúvo Herculano, vivido por Paulo César Peréio, praticamente o próprio. O romance na cadeia e o suicídio exasperado de Darlene Glória, que registra tudo em uma fita cassete para narrar a trama são imagens perpetuadoras da obra.

O Ícone: Paulo César Peréio



Paulo César Peréio é a imagem da cafajestalha. A imagem de uma leseira desbundada. Mas sempre foi, sobretudo, o deboche em pessoa. A figura do ator se confunde com seus personagens porque o gaúcho de Alegrete faz questão de impor o tempo todo uma postura provocativa frente às pessoas. Peréio está sempre testando seu limite e seu bom senso. É a rebeldia sem ligação movimentista ou bandeiras descolores. É a rebeldia sempre incômoda, arrogante, incompreensiva para olhos sem substância líquida do teatro despojado que ele levou para as telas de cinema em suas interpretações pitorescas e deliciosas. Peréio é o cafajeste pelo qual não queremos ter carinho. E é esse seu grande mérito.